Bolsonaro é o pretexto para ele impor tarifas e desestabilizar a liderança brasileira à frente do bloco comercial

Trump não diz na carta, mas o seu alvo é o Brics

À frente do Brics, Lula tem defendido o multilateralismo e discutido alternativas ao dólar, ações que deixam Trump irritado. Foto: Ricardo Stuckert/PR

O ataque virulento deflagrado pelo presidente dos Estados Unidos Donald Trump contra o Brasil, por meio de uma carta desrespeitosa dirigida ao presidente Lula, tem um alvo implícito não mencionado por ele: o Brics.

Pouca coisa tem irritado tanto Trump quanto o bloco comercial de países emergentes, que tem crescido rapidamente e demonstrado força, ganhando adesões de países em todos os continentes.

Trump também não suporta a liderança exercida pelo Brasil, por meio do presidente Lula, junto aos integrantes do bloco.

Não foi por coincidência, portanto, que ele divulgou a sua carta ao final da Cúpula do BRICS realizada no Rio de Janeiro na semana passada.

Logo em seguida, ele ameaçou impor sanções (tarifas de 10%) “muito em breve” para todos integrantes do bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Irã e Indonésia, bem como aos demais países alinhados (ou que venham se alinhar) politicamente a eles.

Para Trump, o objetivo do BRICS não é outro, senão o de enfraquecer os EUA, começando por substituir o dólar como moeda padrão global.

Ponto sensível

E esse é o ponto mais sensível para o presidente estadunidense. Os EUA não aceitam conviver com a ideia de uma proposta que contemple uma moeda comum entre os países do BRICS para transações comerciais que não seja o dólar.

A ideia da moeda comum substituta ao dólar é capitaneada pela China e foi abraçada Lula e outros aliados dos bloco.

O entendimento dos países é de que é preciso reduzir a dependência do dólar para diminuir suas perdas. E a melhor maneira de fazer isso seria deixar a moeda dos EUA de lado e operar com as dos próprios países do bloco.

Tarifaço

Tudo indica que as tarifas de 50% anunciadas para os produtos brasileiros e a chantagem em torno da situação de réu do ex-presidente Jair Bolsonaro na Justiça brasileira são mesmo para valer.

As taxas estão previstas para serem aplicadas a partir de 1° de agosto próximo e a sentença de Bolsonaro deve ser proferida poucas semanas depois, ainda em agosto ou setembro.

A pressão de Trump não é exclusiva para o Brasil. Ele tem feito o mesmo com diversos outros países, incluindo aliados históricos.

Ela faz parte de sua estratégia política, que visa desestabilizar economias e democracias mundo afora a fim de aumentar os seus próprios poderes e da extrema direita mundial.

Mas, apesar das duas, a princípio, serem para valer, elas foram construídas sobre justificativas mentirosas.

Ao contrário do que Trump afirma, o Brasil não leva vantagem alguma sobre os EUA no comércio de bens entre os dois países, e nem Bolsonaro sofre de qualquer tipo de perseguição política.

O fato é que ambas as teorias não se sustentam. Há superávit comercial? Sim, mas não para o Brasil, uma vez que nos últimos 15 anos a vantagem ficou do lado dos EUA.

Dados do próprio governo estadunidense mostram que o superávit do comércio com o Brasil cresceu 31,9% em 2024, chegando a um saldo positivo para o país de Trump de US$ 7,4 bilhões.

Os números oficiais apurados pelo Brasil vão na mesma direção. Eles apontam que no período dos últimos 15 anos a balança comercial foi invariavelmente favorável aos estadunidenses, tendo somado no período quase meio trilhão dólares.

A tese que procura vitimizar Bolsonaro também é furada.

Como é sabido, o ex-presidente é um dos réus na ação de tentativa de golpe de Estado que corre no Supremo Tribunal Federal (STF). Mas, ao contrário do que Trump afirma, ele não é perseguido político.

A quantidade de provas que incriminam Bolsonaro e os demais co-réus, é farta e o processo movido contra todos eles tem sido conduzido com lisura desde o início, sem nenhum tipo de perseguição, seja por parte da Polícia Federal (PF), da Procuradoria-Geral da República (PGR) ou do STF.

A ele (Bolsonaro) e aos outros envolvidos na tentativa de golpe, está sendo concedido o direito da ampla defesa, levando-se em conta o devido processo legal, previsto pelo artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal.

Uma garantia de que o indivíduo só será privado de sua liberdade ou terá seus direitos restringidos mediante um processo justo, exercido pelo Poder Judiciário, por meio de um juiz natural, assegurados o contraditório e a ampla defesa. E não há dúvida de que tudo está transcorrendo de acordo com o que estabelece a Constituição brasileira.

BRICS

O BRICS é um agrupamento formado por onze países membros: Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã.

Serve como foro de articulação político-diplomática de países do Sul Global e de cooperação nas mais diversas áreas.

Os objetivos do BRICS incluem fortalecer a cooperação econômica, política e social entre seus membros, bem como promover um aumento da influência dos países do Sul Global na governança internacional.

O grupo busca melhorar a legitimidade, a equidade na participação e a eficiência das instituições globais, como a ONU, o FMI, o Banco Mundial e a OMC.

Além disso, visa impulsionar o desenvolvimento socioeconômico sustentável e promover a inclusão social.





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Uma resposta

  1. Editorial do Estadão, que não é propriamente jornal comunista:
    “ É deplorável
    celebrar tarifas
    para ganho político
    Direita brasileira, que brande a
    bandeira do patriotismo, tem o dever
    de repudiar a chantagem de Trump
    nal, o presidente Luiz Inácio
    Em entrevista ao Jornal Nacio-
    Lula da Silva demonstrou
    sensateznareaçãoàtarifade
    50% imposta pelo presiden-
    te dos Estados Unidos, Donald T rump,
    às importações do Brasil, caso não seja
    suspenso o processo judicial contra o
    ex-presidente Jair Bolsonaro. Em tom
    comedido,Lulaafirmouqueprocurará
    negociar com os americanos, chamará
    paradiscussãoempresáriosdossetores
    afetados, apelará à Organização Mun-
    dial do Comércio e, caso nada dê resul-
    tado, retaliará. “O Brasil utilizará a Lei
    da Reciprocidade quando necessário”,
    afirmou. Uma eventual retaliação, que
    poderia deflagrar guerra tarifária, deve
    mesmoseroúltimorecurso.
    Num país polarizado, a chantagem
    de Trump suscitou uma batalha políti-
    ca que em nada favorece o Brasil. É ho-
    ra de o país se mostrar unido na defesa
    da democracia, do Judiciário indepen-
    dente e da soberania. Agiu bem o Con-
    gressoaonãohesitarsobrequeladoes-
    colher na contenda. Em meio à queda
    de braço com o Planalto em torno do
    aumento do IOF, os presidentes da Câ-
    mara, Hugo Motta (Republicanos-
    PB), e do Senado, Davi Alcolumbre
    (União-AP), se disseram “prontos para
    agircomequilíbrioefirmeza”.
    Vergonhosa foi a celebração nas hos-
    tes bolsonaristas. O deputado licencia-
    doEduardoBolsonaro(PL-SP)agrade-
    ceu a Trump numa rede social. Faz pa-
    recer que o filho prefere salvar o pai da
    condenaçãoadefenderseupaís.Ainda
    que esse tipo de atitude seja esperado,
    dada a proximidade entre bolsonaris-
    mo e trumpismo, não deixa de ser la-
    mentável. Mostra quão distante do
    BrasilestáoentornodosBolsonaros.O
    chefe do clã pareceu ainda mais alheio
    àrealidadeaopedirurgênciaaosPode-
    respararesgataranormalidadeinstitu-
    cional.Emqueplanetaelevive?
    A direita brasileira, que costuma
    brandir o patriotismo como bandeira,
    tem o dever de repudiar a chantagem
    deTrumpededefenderointeressena-
    cional, a democracia e a independên-
    cia do Judiciário. Foram infelizes as de-
    clarações do governador de São Paulo,
    Tarcísio de Freitas (Republicanos), em
    deferência a Bolsonaro, ainda que de-
    poiseletenhaprometido“abrirdiálogo
    com as empresas” e mantido encontro
    comdiplomatasamericanos.Nãoého-
    ra para posições dúbias. O governador
    de Goiás, Ronaldo Caiado (União),
    CARLOS ALBERTO
    SARDENBERG
    blogs.oglobo.globo.com/opiniao
    sardenberg@cbn.com.br
    afirmouqueLulaafrontagratuitamen-
    teogovernoamericano—podeserver-
    dade, mas foi Trump quem ofendeu o
    Brasil.OgovernadordeMinas,Romeu
    Zema(Novo),depoisdeapoiarTrump,
    tentou amenizar dizendo que “erros e
    injustiças não devem ser consertados
    commaiserroseinjustiças” .
    É verdade que os arroubos autoritá-
    rios trumpistas ironicamente podem
    dar a Lula —acuado pela queda de po-
    pularidade, reflexo de um governo
    ruim—achancedesairdascordas,co-
    mo já aconteceu noutros países, onde
    líderes impopulares se recuperaram
    com a ajuda indireta dos ataques de
    Trump. O episódio deu a ele um catali-
    sadorperfeitoparasuapopularidade:o
    inimigoexterno.
    Não há dúvida de que a decisão de
    Trump se presta a todo tipo de uso po-
    lítico. Mas questões concretas não po-
    demserignoradas.Atentativadeinter-
    ferir no Judiciário brasileiro é absurda.
    Senãoforrevertida,atarifade50%ali-
    mentará a inflação, prejudicará o cres-
    cimento, porá em risco milhares de
    empregos e causará estrago em setores
    pujantes, como indústria e agronegó-
    cio. É interesse de toda a sociedade brasileira.”

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